Quem disse que entendemos o
mundo?
O mundo é aquilo que vemos, mas é
também o espaço em que vivemos. Alguns têm um mundo vasto, outros um mundo que
se reduz a si, mas seja como for, o mundo é o que experimentamos e diretamente
ligado a como o experimentamos. Mas por que eu trago essa questão?
Um homem e uma mulher se
encontram. Àquela altura seriam incapazes de dizer que o outro estava pior. O
desânimo e a desilusão tanto lhes eram as sensações mais comuns que, a quem
perguntasse, logo diriam que a vida que têm nem vida é.
Isolados na dor que escondiam do
mundo enquanto acumulava, dia após dia foram cuidando de enterrar os sonhos que
preferiam evitar sonhar e passaram a questionar qualquer possibilidade de o
mundo realmente ser mais do que essa obrigação maçante de se estar vivo
pensando que se está tudo bem.
Sonhos... de que servem se não se
realizam de per si? Por que alguém gastaria seu tempo com desejos?
Pragmáticos, já nem assistiam aos
dias que passavam e, suas vidas, ao contrário do que se deveria, não lhes
somavam vida. Perdiam ela.
Mas que tipo de escolha é essa?
Quem escolhe o menos? E por que razão? É excesso de frustração, falta de
imaginação? Uma opção consciente por uma vida que, sendo mais ou menos, não
traz o risco de se sentir falta dos melhores tempos que, se forem, talvez não
voltem?
Acontece que tem um outro ponto:
quem decidirá o que é o melhor da vida? O melhor da vida será o que sonhado ou
o que vivido? O melhor da vida é a realização de um projeto ou o acaso bem
trabalhado? E isso é importante porque os sonhos podem fazer toda a diferença.
Afinal, o que separa o sonho da fantasia?
Em alguma medida nós somos
recorrentemente vítimas do nosso próprio dualismo. Se não quando se fala em
corpo e alma, somos dois em relação ao real e ideal, ou seja, somos dois ao
menos em relação ao que vivemos e ao que fantasiamos. Nos construímos dois
mundos e estaria tudo bem, não fosse o fato de que os antepomos um ao outros
como se eles fossem refúgios em que segredamos nosso medo de não nos
realizarmos.
Quando não tomamos cuidado, no
mundo da fantasia depositamos toda nossa tristeza com o mundo dos sentidos, da
pele. No mundo fantasia é que deixamos guardadas as nossas expectativas em
relação a quem nos queremos no mundo e para o mundo e o que nos queremos desse
mundo. É nele em que encerramos a nossa vontade de sermos mais felizes do que
tristes e é onde sonhamos sonhos de grandeza na vida profissional, na vida
familiar, no sexo, no amor. É nesse mundo em que somos imortais e, tudo o que
queremos, acontece sem nenhum tipo de arrependimento ou frustração porque na
fantasia não precisamos nos adaptar ao mundo. Ele é para nós. Ele é feito sob
medida para alegrar. E ele alegra. Sim. Porque ao nos imaginarmos felizes e
campeões em tudo, sentimos aquele acréscimo de autoestima que nos faz nos
sentirmos incríveis, pelo menos nessa fração de segundos em que olhos abertos
brilham o sonho acordado.
Mas no mundo da fantasia, a
autoestima esfria mais do que aquece. Porque o calor é questão de química e
física realizadas no atrito próprio do encontro que estimula sentidos que se
acordam à simples presença de quem é palpável porque é real.
Sonhe-se o melhor dos sonhos e
ainda assim ele não se fará sentir no corpo. Porque a fantasia não é sensível
como a realidade se faz sentir. E, nesse mundo da realidade é onde, não poucas
vezes – por alguma razão de circunstância e conveniência – nós suportamos a
desambição, desistimos das revoluções e das atitudes que nos moveriam para além
da nossa própria esperança de uma vivência melhor.
Esperança... bendita ou não?
Porque a fantasia e a realidade não precisam ser polos distrativos. A fantasia
pode – deve – ser o combustível das ações no mundo real, a busca pela certeza
de que a vida não foi dada para o mais ou menos e que esse mundo que tantos
fazem que seja dois, deve ser um como uma é vida e como uma são tantas as
oportunidades
Um homem e uma mulher se
encontram. Àquela altura seriam incapazes de dizer que o outro estava pior. O
desânimo e a desilusão que lhes eram as sensações mais comuns não passavam da
falta dessa esperança. Nada mais eram do que a sensação de que tudo o que
quiseram foi uma construção arquetípica a que conduzidos pela arte, pela
poesia, pelas histórias que consumiram, mas que, em si, nunca realizaram.
Mas entrevistássemos suas almas e
elas confessariam que a desesperança é só o disfarce encerrado no mundo que
trancafiaram no subsolo dos seus sentidos. A desesperança não passaria de um
manto a espera de ser descoberto, como aquela máscara de ferro que por anos
manteve cativo aquele que nascera para ser rei.
E fossem de fato práticos,
deixariam de temer a esperança de se realizarem e confiariam que a vida é
dádiva dada a quem não se economiza e se lança e se arrisca e se dá sem medo
porque viver é isso: é ser de quem te tem e ter quem da gente se faz.
Ah... mas se não acontecer pelo
menos não perdi a delícia da fantasia! Mas é onde você se engana. Não há
fantasia perfeita que seja melhor do que a realidade e por mais que você espere
demais, basta a coragem de entender que o que você quer não é questão de chegar
pronto, mas de saber até que ponto está disposto a revelar o que deseja como
forma de saber até onde se pretende chegar.