quinta-feira, 12 de junho de 2014

Primeiro Jogo da Copa: e aquela história de “homem cordial”?


“Já se disse, numa expressão feliz, que a contribuição brasileira para a civilização será de cordialidade – daremos ao mundo o ‘homem cordial’. A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam, com efeito, um traço definido do caráter brasileiro, na medida, ao menos, em que permanece ativa, fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal.”

Assim, Sérgio Buarque de Holanda começa o trecho em que cunhou a expressão que lhe fez mais famoso, até que passasse de festejado autor de “Raízes do Brasil” a “pai de Chico Buarque de Holanda”, como ele mesmo, Sérgio, assumiu. O brasileiro seria o “homem cordial”.
O início dessa Copa do Mundo mostrou totalmente o contrário. Ao contrário do que possa parecer, não torço contra a Seleção Brasileira, apenas não consigo me empolgar enquanto torcedor de futebol. Claro que ficarei feliz em ver a exaltação do meu país, mas preferiria – sem hipocrisia – vê-lo se destacando em educação, cultura, saúde... Como acredito que 99% dos brasileiros, assisti a primeira partida da Copa do Mundo. Um jogo feio, truncado, nervoso e que contou com um erro decisivo da arbitragem marcando um pênalti que não existiu. De positivo, só o momento do hino nacional, mostrando uma união de brasileiros que, infelizmente, nem sempre é pro bem.
Futebol à parte, o momento que mais me incomodou foi a vaia da torcida brasileira para o time croata. E daí a gente vê que, pelo menos nessa geração atual de brasileiros, se há algo que não se pode dizer de nós, é que sejamos cordiais. No papel de país anfitrião, o mínimo que a torcida deveria fazer era aplaudir o time croata de modo a que se sentissem bem-vindos ao nosso país para disputar uma partida de futebol e não uma guerra. Mas cadê a hospitalidade. O curioso é que o próprio autor, a certa altura, afirma nesse mesmo livro “Raízes do Brasil”.
“Seria engano supor que essas virtudes possam significar ‘boas maneiras’, civilidade. São antes de tudo, expressões legítimas de um fundo emotivo extremamente rico e transbordante.”
Dentro desse jeito emotivo de ser, o brasileiro é desrespeitoso. E não adianta falar que estou generalizando se, no momento da vaia, foram mais de 60 mil pessoas vaiando. Eu continuo insistindo que o grande problema do Brasil são os brasileiros (basta ver que um brasileiro quebrou o dedo de um argentino que se recusou a soltar a bandeira de seu país) e quando eles – brasileiros – estão em grupo, ou é festa ou é balbúrdia, mais balbúrdia do que festa.
Sérgio Buarque de Holanda ainda disse que:
“No ‘homem cordial’, a vida em sociedade é, de certo modo, uma verdadeira libertação do pavor que ele sente em viver consigo mesmo, em apoiar-se sobre si próprio em todas as circunstâncias da existência. Sua maneira de expansão para com os outros reduz o indivíduo, cada vez mais, à parcela social, periférica, que no brasileiro – como bom americano – ter a ser a que mais importa. “
Vencer um jogo de Copa do Mundo sendo “ajudado” pelo juiz, é lamentável e se exaltaria o time e a sua comissão técnica se, ao invés de cinicamente dizerem que viram pênalti, que viram falta no goleiro quando não houve, que a arbitragem foi boa, reconhecessem que houve o erro, que não foi pênalti. Mas não. O brasileiro é o tipo que diz que ganhar roubado é mais gostoso ao invés de aproveitar pra gritar para o mundo que se o brasileiro vai às ruas cobrar o fim da corrupção é porque ele não transaciona com o erro, ele execra e acusa o erro e o mal feito, porque prefere as coisas limpas. Mas não é bem assim...
Xingam a presidente a plenos pulmões para o mundo inteiro ouvir. E não importa as divergências que se tenha com ela ou com o partido e governo que representa: ali era a instituição presidência da república que se encontrava e deveria ser reverenciada pelo povo. Não a Dilma Vana Roussef, mas a representante maior do Estado brasileiro.
O jogo foi ruim, mas a torcida foi pior.

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