Ao contrário do que a propaganda
insiste em afirmar, ser diferente não tem sido normal. Ser diferente tem sido motivo
de escárnio, de indignação, de diferentes injúrias e diferentes formas de
discriminação. E não me refiro às diferenças de raça, sexo ou gênero. A
diferença que mais vem sendo atacada é a diferença de opinião.
As opiniões nunca pareceram
incomodar tanto. Por alguma razão que só o tempo passado explica e o tempo
futuro confirmará, vivemos uma época em que as opiniões alheias têm sido ora
motivo de acréscimo de autoestima, ora motivo de execração do outro.
Nesses tempos atuais, as pessoas gozam
na satisfação de ouvirem pensamentos que se assemelham ao seu ao mesmo tempo em
que se encolerizam quando ouvem algo que não são capazes de considerar. Assim,
a impressão que se passa é a de que estamos todos sempre armados, sempre
preparados para o patrulhamento de pensamentos que não nos dizem respeito. E se
nos insurgimos contra nosso “adversário intelectual”, raramente é com um
intuito de paz ou de reflexão, mas apenas com uma tentativa (in)consciente de escorraçá-lo
pelo simples fato de ter ousado falar.
O silêncio, pouco a pouco, vai
tomando conta das pessoas. É cada vez mais raro acharmos quem fale o que pensa
ou quem assuma um desgosto, quem confesse pecado ou um preconceito ou até mesmo
uma vontade de que tudo seja ao contrário do que é e que a sua vida seja o
contrário do que ele mesmo se fez... é cada vez mais improvável que alguém admita
um pensamento que seja. A opinião pública “o suicidará”.
De repente o mundo virou uma
grande vitrine em que somos o departamento de marketing responsável por
convencer o mundo de que somos melhores uns que os outros. Somos pessoas
físicas, cidadãos, pagadores de nossos impostos, donos do nosso direito, mas
agimos como se fôssemos Pessoa Jurídica, dependente de menos juízo para que
alcance uma melhor reputação. A opinião pública passa a ser tão relevante que
nos envergonhamos de cada nuança de diferença que nos percebamos.
Mais do que nunca nos queremos a
aparência de mais do que todos. Queremos “ser” (mais o certo é “parecer”) os
mais devotados à nossa religião, os mais engajados à nossa ideologia, os mais
participativos da nossa comunidade. Só que tudo isso só valerá, desde que sejamos
reconhecidos como tal.
Como não queremos que vejam nossos
defeitos e tememos que não se nos notem as nossas qualidades, corremos a
alardear os defeitos alheios, a rebaixar o que é bem visto, menoscabar o que é autêntico,
a vilipendiar a quem simplesmente se deixa ser. Logo, somos o primeiro
inquisidor da maioria e nosso objetivo é o de que seja menos julgado por eles, julgando-nos
a nós mesmos como “o grande maioral”.
Enquanto isso, a sociedade
envelhece anos em poucos dias. Não há novo que resista à patrulha que não
permite nada e condena tudo. Até há quem pensa, mas prefere calar; há quem
queira, mas prefere conter e há tantos que sonham, mas não há coragem pra
ousar.
E daí se um gosta do preto, outro
gosta do branco, um gosta de mato, outro gosta de asfalto?
E daí se um fotografa o céu, se
outro não repara a lua, um ouve música e alguém prefere o silêncio?
Por que o meu jeito tem que ser o
jeito do outro? Por que se precisa de música pra dançar, razão pra sorrir e
motivo pra chorar? Quem nos deu o direito de censurar, condenar e
ridicularizar? Se não há um jeito único de ser, também não há – nem deve haver –
um único jeito de pensar.
É... vivemos tudo errado. A semelhança não une, mas separa, justamente porque somos únicos e não devemos ser iguais. Forçarmos uma igualdade fingida reforçar uma sociedade cada vez mais docente e cada vez mais hipócrita. Quanto mais queremos parecer uns aos outros e pros outros, mais é a distância que nos separa uns dos outros.
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