A minha dor te incomoda. A minha alegria também te incomoda.
O meu amor te incomoda. A falta de amor em mim te incomoda também.
Não. Não estou falando
especificamente nem de mim e nem de você que me lê. Estou falando das pessoas
em geral. Parece que “sentir” é cada vez mais proibido. Se você sente dor e
chora, logo querem te dar um remédio pra disfarçar a dor. Se você está de luto
e se desespera, logo alguém te oferece um calmante pra te desligar. Se você
está alegre e se anuncia feliz, logo surge um censor pra te duvidar. Se você
está com raiva e se expressa, eis que vem o “bom” pra dizer que raiva não é
sentimento que se deve expressar. A todo o tempo querem te pautar, te
controlar.
Nunca reparou nisso? Tem sempre
alguém pronto pra dar uma opinião sobre o sentimento alheio. Não é a pessoa
quem sente, nem é a pessoa quem viveu, quem experimentou, quem tinha a
expectativa realizada ou que não se realizou, mas ainda assim essa pessoa que
não é nada acha que tem condição de dizer que há exagero, que há falsidade, que
há erro ou que há muito torpor em quem, ao invés de ficar na sua, não teve medo
de se expor.
Por que isso acontece? Porque as
pessoas estão cada vez mais incapazes de lidarem com os seus sentimentos e,
então, resolvem se meter no sentimento do outro. Vivemos tempos em que sentir parecer
ser cada vez mais ofensivo. Alguns exemplos:
a) A pessoa não é magra, mas
posta fotos na praia porque se sente bem e logo ofende aquela outra que é
magra, mas queria ser mais magra e por não ser magra como quer, não consegue se
gostar e tem raiva de quem se gosta.
b) A outra é feliz na balada,
gosta de balada, posta fotos de balada e todos acham que se expõe demais porque
sua vida é vazia e precisa fazer conta que é feliz. E quem faz isso, geralmente,
é aquela pessoa que não aguenta mais ficar em casa, mas que não tem coragem de
sair e descobrir se a vida e o mundo ainda têm algo a lhe oferecer (e sempre
tem).
c) Alguém reclama do mau serviço
de uma empresa, de um órgão público, de um prestador ou de Deus, do seu time de
futebol, do médico ou da justiça e logo surge alguém dizendo que a pessoa não
deve se sentir contrariada e nem expor seu desgosto porque está se expondo
demais e ninguém precisa saber o que ela pensa, o que sente e as razões que lhe
levaram a isso.
Ora, não é mais fácil que quem
acha que deve calar se cale e quem acha que deve falar, fale e seja respeitada
no seu manifestar, ao invés de bombardeada por ter tido a coragem de falar? Parece
que não. Todos parecem ter opinião sobre tudo. Mas tudo que é do outro, porque
fica mais fácil não precisar olhar pra si e se descobrir ruim e desinteressante
(e pior, sabendo que a culpa é toda sua).
O que vejo é que sentir ofende,
sim. Ofende quando a pessoa consegue se expressar e o outro não. Ofende quando
a pessoa tem coragem de se mostrar e o outro não. Ofende quando a pessoa
desafia os costumes e o outro não. E a coragem dessas pessoas escancara a
pusilanimidade das outras que, reveladas em sua mediocridade, investem contra
quem apenas se permitiu sentir.
E sentir livre. Porque, não sei
se você percebeu, mas estão querendo aprisionar até o sentimento. Estão
querendo dizer como se deve e se pode sentir. Se você sentir como a maioria,
não tem problema, talvez deixem passar. Mas se você não gostar do que todos
gostam, não aplaudir o que todos aplaudem e não defender o que todos defendem,
você vai ser condenada numa pena que só não vai ser mais cruel do que todo o
processo de julgamento em que vão te judiar.
Não vamos deixar que seja assim.
Vamos gritar, vamos cantar, vamos sorrir, vamos chorar, ousar, duvidar, nos
mostrar, pular, ser bobo, ser louco, mudar e ser tudo de novo sem que ninguém
consiga nos tirar o prazer de ser, rever, viver e gozar.
Agora, se o sentir te ofende, é
melhor se acostumar....
Um comentário:
Muito Bom
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