Quantas foram as vezes em que
você sorriu pra esconder uma tristeza ou fez do sorriso um escudo que impedisse
que te vissem quem é? Quantas vezes você abriu os lábios, mostrou os dentes bem
cuidados por tratamentos longos de ortodontia e escondeu teu sentimento atrás dessa
parede feita inteira de você?
Sorrir com os lábios mostrando os
dentes é fácil. Se for uma fotografia, melhor ainda, porque ela congela aquele
momento e permite que a gente sugira a falsa impressão de que nós somos (ou
pelo menos estávamos) felizes.
Acontece que muitas vezes você
sorri, eu sorrio, todos nós sorrimos segurando a vontade de chorar. Sorrimos só
porque parece que é o certo a fazer já que não queremos ser os únicos a mostrar
dor onde todos parecem só conhecer o prazer. E então a gente abre os olhos, diz
o “xis (ou cheese)” e pronto: quem
nos olha nos pensará bem melhor do que estamos. Mas por dentro a gente chora a
dor que não cala e convive com a hemorragia que não sangra, mas também não
estanca. Uma hemorragia que nos suga a própria alma.
Foto de família. “Atenção, olha o
passarinho... click”. “Que família linda e feliz, nem deve ter problema”. Mas
depois do flash foi cada um pro seu canto, pois representaram seu papel até o
momento do “corta!”. O marido já tem outra família, a esposa se encontra com um
antigo namorado e enquanto o filho fuma seu baseado, a filha engravida do
namorado da irmã. Que família linda e feliz aquela que mostra os dentes e os
lábios e parece que sorri.
“Vamos tirar uma selfie”. Amigos se misturam, se apertam,
se abraçam, sorriem enquanto quem estica o braço tenta enquadrar todo mundo. “Que
turma alegre e unida. Quisera ter amigos assim”. O que quase ninguém sabe é que
o amigo de azul cantou a mulher do amigo de verde que tem um caso com a irmã do
colega de preto que, mesmo com a esposa ao lado, não deixa de alisar as pernas
da única amiga solteira, mas que está de caso com o chefe casado que ainda não tinha
entrado na história.
“Você precisa atualizar a foto do
teu perfil. Vem cá, deixa que eu tiro pra você”. Sorriso aberto, vasto, amplo,
reto, branco. 1 curtida. 2 curtidas. 15, 38, 57, 132 curtidas. “Queria poder
sorrir assim”. “Ah que vida boa essa pessoa deve ter”. “Também, nunca passou
dificuldade”. Mas depois da foto o vazio de saber que por trás do sorriso
bonito morava um sorriso vazio e desalegre.
Mostramos cada vez mais o que
somos cada vez menos e isso faz mal pra todo mundo. Talvez a falta cada vez
maior de humanidade nas pessoas venha disso de nos querermos super-humanos, nos
disfarçando de imunes às tristezas, às vilanias e às cobiças, ao invés de
reconhecermos que às vezes invejamos e choramos também. Se a pessoa acha que é a
única que sente dor e não se quer a única a sentir dor, talvez até goste de
saber da dor do outro.
Não podemos aceitar que seja
assim. Precisamos de verdade para conosco. Precisamos voltar a sorrir de
verdade, por inteiro, com o corpo todo. Um sorriso que comece nos olhos, passe
pelos lábios, sinta na pele, no tato, no âmago e de coração. Um sorriso que
seja de verdade.
Mentir que somos felizes, não nos
faz mais feliz. Só nos faz ainda mais tristes.
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