domingo, 29 de julho de 2012

Quando a nossa mudança é o outro

Tempo e vida (7)[1]Não adianta negar. Já aconteceu comigo, com você, com teu vizinho e com aquele parente distante que a gente só lembra quando vê a foto no álbum de família: em algum momento das nossas vidas mudamos todos os nosso planos por causa de alguém.
Ter coragem de mudar é sempre algo positivo. Não se pode dizer que não é bom. A grande questão é: por que estamos mudando? O que é que nos motiva nessa vontade de sermos diferente do que pensamos que iríamos ser?
Nossas vontades são inconstantes e nossos planos nunca são absolutos, mas nossa vida se baseia nas decisões que tomamos e nossos caminhos se fazem na medida dos passos que nos permitimos andar. Logo, se somos nós que fazemos para nós, nossa mudança não pode ser por causa do outro.
Mas nem sempre é assim que acontece. Quantas e tantas vezes mudamos tudo o que queremos (queríamos) para o futuro em nome do presente de então? Do nada nos pegamos ignorando a verdade de que a satisfação que se sente no agora é frágil e enganadora. Nos fazemos levianos com nós mesmos na medida em que apostamos nosso tempo no pouco que temos agora, muitas vezes certos de que é o melhor do que jamais iremos ter e, quando o tempo passa e a verdade vem, notamos que o que parecia “para sempre” não tinha mais do que a brevidade de um sonho bom.
Uma coisa que sempre achei injusta na vida é a necessidade de definirmos no fim da adolescência aquilo que acreditamos que será o nosso futuro. Nem terminamos o Ensino Médio e já temos que nos lançar num curso Superior específico. De uma certa forma, quando preenchemos o formulário de inscrição do vestibular, estamos pós-datando o cheque a ser compensado ao longo do nosso futuro. E isso é cruel.
A crueldade dessa etapa da vida está no fato desse período ser o período em que temos certeza que temos uma certeza (e o tempo mostrará que nunca tivemos certeza nenhuma). Quando saímos da adolescência somos todos intransigentes. Peremptórios. Pensamos ter todas as respostas e carregamos a convicção de que nos conhecemos melhor do que ninguém jamais nos conhecerá. Mas a verdade é que sabemos menos do que nos permitimos pensar.
Ainda adolescentes descobrimos uma vida de instantes complexos. Descobrimos que sentimentos não são ficção e que a ficção tem muito de vida real. O primeiro amor parece ser destinado a ser o amor do resto de nossas vidas. As pequenas glórias parecem o prenúncio de toda sorte de vitórias e isso nos faz confiantes de um sucesso a que estamos predestinados e, se não contarmos com a ajuda de quem sabe da vida mais do que o nada que sabemos, nos sufocamos na nossa própria arrogância.
E se você está se perguntando o porquê de eu estar falando em adolescência nesse texto, saiba que é porque, ao menos no amor, somos todos eternos adolescentes.
Quando amamos parece que o tempo parou e que esse amor nos fez outro. Amamos e o sonho de ontem já não sobrevive ao sentimento de hoje. Se antes nosso caminho era pra esquerda, quando amamos nosso caminho segue o caminho do outro (muito mais importante que o nosso, tão insignificante por ser só nosso). E é aqui que a mudança começa a ser preocupante.
Se mudamos nossa vida, sonhos e quereres por causa do outro, mudamos pelo motivo errado e, no instante em que nada der certo – e muito provavelmente não dará – será a esse outro que culparemos.
No começo desse mesmo amor, somos invariavelmente mais altruístas. Ficamos tão encantados com a delícia de sentir amor que pensamos ser mais importante o que fazemos pelo outro e muitas vezes nem esperamos nada em troca e nem pensamos se o outro está disposto a mudar. Mas não importa.
A verdadeira mudança tem que vir acompanhada de um verdadeiro motivo. Muda-se para ser melhor e ser melhor não é agradar o outro ou viver como se só houvesse um agora que não traz consequências depois. Mudar é crescer e crescer exige rompimentos: a menina que cresce se separa da boneca e o menino do carrinho; as roupas da infância não vestem corpos crescidos e os colos que abrigavam, já não afastam o mal do mundo.
Crescer é romper com o passado, ser cruel com o presente e se preparar para o futuro, sendo nós mesmos a mudança que queremos para o nosso próprio mundo.
Mudar pelo outro é colocar a responsabilidade da nossa vida nas mãos e nos sonhos de alguém que não vive e nem pode viver nossa vida. Ele não tem responsabilidade para conosco e nós não temos o direito de exigir dele o que só depende de nós.
Seja lá o que fizermos e escolhermos, que seja sempre primeiro por nós e para nós. Não de uma forma egoísta. Mas, só saberemos, enfim ser dois, quando soubermos – de verdade – quem somos quando somos um.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Vamos construir?


Vivemos tempos em que tudo é para já. Tempos em que o imediatismo impera nas pessoas e os quereres são cada vez menos um projeto e muito mais um desejo. Tempos em que “desafio” não passa de uma palavra e projetos parecem mera perda de tempo.
O mundo está todo ele mais rápido. A velocidade nas comunicações, a diminuição das fronteiras, o alcance de toda e qualquer informação, tudo isso faz com que tenhamos pressa. Não por um acaso, o que mais se escuta nos dias atuais é “estou numa correria”. Mas a pressa é de que? De obter tudo e ainda querer mais?
A ânsia por conquistar mais impede que se desfrute o que já conseguimos e que, no mais dass vezes, nem é tão pouco assim. É só essa a nossa mania de insatisfação que faz com que colecionemos frustrações.
O fato é que estamos cada vez mais ansiosos e ansiedade demais faz mal. Não sabemos mais esperar. Não queremos e nos recusamos a esperar e se a espera é necessária, nos irritamos num “zas traz“.
Tem faltado paciência. E a culpa é de quem?
A vida não tem um roteiro e nem uma única definição. A vida é um dia de cada vez até que se acumulem todos eles. Mas ela passa; ela acaba. No fim das contas qual terá sido o saldo do que deixamos: Os amores que tivemos ou as mulheres que conquistamos? O trabalho que fizemos ou as farras que farreamos? O esforço recompensado ou os dias e noites desperdiçados qual cigarra no verão?
Ah, a vida. Na vida nós não somos meras personagens de nós mesmos, mas sim, os próprios autores dessa nossa história que – correm os dias – se confunde com outras e novas histórias. No livro da vida não nos permitiram escrever o começo e não nos é permitido escrever o final, mas nos foi dado bastante espaço pra preencher.  
O que me parece é que as pessoas estão cada vez mais preguiçosas para escrever, sem inspiração para uma história interessante e, no livro da vida, se falta inspiração, falta vida; no livro da vida, quem não escreve já não sabe viver.
Sim, porque não adianta se esperar que a vida aconteça à tua revelia e sem que você tenha que merecer. Quem sabe faz, quem quer dá um jeito de conseguir. Mas nesse mundo imediatista e cheio de ansiedade, a dificuldade parece estar em saber exatamente o que se quer.
Vivemos imersos em tantas dúvidas que não parece fazer sentido dispensarmos energia em algo que não nos bastará amanhã. E pensamos isso mesmo quando evitamos considerar as perspectivas do amanhã. Queremos viver o agora, conseguir o agora, experimentar e ter agora, muitas vezes abrindo mão da própria previdência.
Quando se vive, se quer, se experimenta e se tem só o agora, corre-se o risco de estar descartando o amanhã.
É clássico o verso onde o rock-star diz não conseguir ter satisfaction e talvez não tenha porque não sabe onde procurar. A satisfação está em nós mesmos. A satisfação está em se saber que fizemos o melhor que podíamos. Está nas conquistas do que sonhamos e pelas quais lutamos.
Descubra-se! Seja sincero contigo. Não tenha medo de querer se você está disposto a conseguir. O sacrifício de hoje se justifica no sucesso de amanhã e a vida premia esforços. O sacrifício não é eterno, não é para sempre, ele dura o tempo necessário, nem mais, nem menos. Mas você tem que saber esperar.
Conheça alguém. Pegue sua mão. Descubra seus gostos e deixa que ela descubra os teus. Invista. Construa. As pessoas não são descartáveis, então para que trata-las assim? Pode ser estranho no começo, talvez difícil e muitas vezes tão trabalhoso que não se vê muito sentido, mas quando você menos esperar, terá um companheiro, uma companheira ainda melhor do que você jamais sonhou.
Os Contos de Fadas, as novelas, os filmes e os romances não estão errados. Mas eles só mostram uma pequena fração do que é a vida. Não existe mágica, não existe destino e nem a felicidade para sempre. Na vida que nos compete, sempre há o capítulo seguinte e ninguém os escreverá melhor do que nós mesmos.
A vida não acontece por si, ela se constrói. Nada vem pronto, mas tudo pode ser feito e só depende de nós.
E então, vamos construir?

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Amor com afeto e afeto sem amor

L’amour, hum hum, j’em veux pas
(Eu não quero o amor)
J’préfère de temps em temps
(Prefiro de tempos em tempos)
Je prefere le goût du vent
(Eu prefiro o gosto do vento)
Le goût  étrange et doux de la peau de mes amants
(O gosto estranho e suave da pele dos meus amantes)
Mais l’amou, hum hum, pas vraiment!
(Mas o amor, hum hum, de jeito nenhum)
(Carla Bruni)




“Espero para ver se você vem
Não te troco nessa vida por ninguém
Porque eu te amo... eu te quero bem!
Acontece que na vida gente tem
Que ser feliz por ser amado por alguém
Porque eu te amo, eu te adoro, meu amor
(...)
Grito ao mundo inteiro
Não quero dinheiro
Eu só quero amar.” (Tim Maia)



Duas canções. As duas falam de amor. Em uma se quer amar, enquanto na outra, dispensa-se o amor. E daí eis que me pergunto: queremos amor? Sabemos amar?
Aqui se falará do amor que une duas pessoas, carnal, terreno, profano e divino.
Se procurarmos nas músicas, nas poesias (e até mesmo nas prosas) encontraremos toda forma de amor. Poetas apaixonados enxergam nas cores do mundo a mesma vibração de seu peito, todo ele cheio de um sentimento de vida que descobriu nos braços de ontem e que redescobrirá no ciclo do novo (e, no mais das vezes, diferente) abraço de amanhã.
Por sua vez, compositores cantarão dores de um amor finito, cuja herança, a solidão, é a companhia inevitável de uma dor que fazem questão de rimar com esse mesmo amor do poeta feliz.
Nos filmes e livros amores impossíveis são sempre possíveis, talvez porque o amor seja sempre possível. Não sei. Não se trata disso. A pergunta é sabemos amar? Queremos amar? Estamos prontos para amar?
Essa última pergunta me lembra de uma terceira música. Guilherme Arantes. E nela ele começa dizendo que tudo que queria um dia para ele, tinha visto na sua musa desde o começo, num momento em que a paz existiu e ele se sentia renascido.
Mas será que amar é isso? Será que amar é renascer e daí se afirmar que cada novo amor, uma nova vida e que, portanto, o novo amor só vem se sepultamos o amor que já morreu?
Certamente ser amado não é (ou pelo menos não deveria ser) o primeiro requisito para se amar ou mesmo um motivo determinante para isso. Fosse assim, não teríamos tantas e tantas histórias de amor não correspondido.
Então, o que é preciso para amar? E pergunto ainda: Basta amar para estar junto?
Você que me lê e tem alguém: por que você está junto de quem você está junto?
Você que me lê e não tem ninguém: o que você precisa pra ter alguém de quem estar junto?
Você que me lê e tem muitos alguéns: o que você pensa que está fazendo?
Talvez os primeiros digam que estão juntos porque amam ou porque a pessoa com quem estão lhes faz bem (para não dizer daqueles que estão só esperando algo melhor). Por sua vez, os da segunda pergunta diriam que esperam aquele alguém que balance seu mundo, que seja companheiro e que desperte o melhor de si. Para que, enfim, os terceiros não saibam dar uma resposta que sirva como boa justificativa para que não sejam de ninguém, ao mesmo tempo em que são de todo mundo e acham que o mundo é seu também.
Para Tom Jobim, fundamental mesmo era o amor, sendo impossível viver feliz sozinho.
E daí eu venho e afirmo: é possível viver um amor sozinho. É possível amar sozinho. Não sei por quantos dias, por quantos meses ou anos. Mas o amor não depende de troca para existir. O afeto sim.
Penso que se há uma causa justa para que duas pessoas se façam juntas uma da outra é a troca de afeto. E o afeto é um elemento importante do amor. É o se sentir amado, desejado, bem quisto. É se sentir parte de um projeto de vida em que os sonhos são positivos. Afeto é a troca de beijos e de carinhos. É o que mantém acesa a chama do amor dita por Vinícius.
Todos nós conhecemos casais que “se sentem presos” em relações que julgam não satisfatórias, ou se queixam das indiferenças do outro às suas necessidades, mas que, quando indagados do por que se mantém na relação, tergiversam e dão uma desculpa qualquer.
Provavelmente eles mesmos não saibam, mas o que os mantém junto é o amor. Um amor que sobrevive apesar da falta de afeto. Mas um amor que deixa de ser essencialmente carnal, pra se tornar um amor fraterno de quem sabe que vai sentir a falta da chatice do outro ou mesmo daquela presença tão ausente.
Mas enquanto a alma pede amor, o corpo quer afeto e essa é uma equação delicada de se acertar. Mas que, ao menos, não haja traumas e nem dores, mas sim, a coragem de não desistir de amar e de querer e de ser amado e ser querido. Sempre! O amor não morre pra nunca mais nascer e o afeto não acaba para nunca mais voltar.
Seja pelo de hoje, seja pelo que virá amanhã, ainda vale muito apena amar e se deixar levar.