sexta-feira, 26 de maio de 2017

Aquele encontro... (aquele que a gente espera e que um dia vem - ou que um dia veio)

Tem gente que a gente gosta primeiro e vai entender o porquê só depois.
Sabe quando você conhece do nada ou até já queria conhecer, mas não sabia bem o que esperar? É mais ou menos isso. Você se pega vivendo aquele instante de descoberta do outro, tentando entender o que te delicia naquela presença que até pouco antes você sabia pouco (talvez nada ou quase nada), mas que desde então você sente que não se importa em aprender muito.
E é daí que começa a querer entender se é o jeito dele ou dela falar sorrindo, ou aquele sotaque quase cantado. Se de repente é o jeito mais debochado de quem não faz questão de se levar a sério ou os olhos que te olham tão intensos que você chega a acreditar que não é só você quem gosta do que está acontecendo. Tudo parece tão melhor do que era antes de ser, que logo chega a achar que já é aquele momento que nem te sabia possível: o de um encontro novo que vive como se sempre tivesse havido.
Você se descobre o ouvinte que nunca se soube e o falante que sempre evitou. Ouve do outro suas melhores histórias, ri delas, tem toda a sua atenção voltada a única pessoa que te interessa e que acabou de vir dentre as outras tantas – as outras várias – que nunca te interessaram. Na verdade, você vive o momento em que já nem tem por que se lembrar de que outra alguém te interessou.
O vinho que pedem é sorvido a doses de palavras que te vão para muito além dos ouvidos e quando é a sua vez de falar, cada meneio de cabeça, cada sorriso de confirmação ou aceno de surpresa é como uma vitória que você comemora só consigo, mas que te indica que o horóscopo acertou quando indicou uma quadratura lunar que te traria uma nova emoção.
Escuta de quando ela morou fora, dos planos de fazer jornalismo até a escolha de voltar pra casa, de como gosta da poesia do Neruda, da música do Caetano, da letra daquela música que ninguém conhece, mas ela, inquieta e que gosta do novo, descobriu (garimpou!) e, ao mesmo tempo, se pega se perguntando quando é que você é que terá o que seja tão interessante de dizer, perto do tanto que está gostando de escutar.
Se a hora não para – e nessas horas ela voa! – logo a conta do restaurante chega junto da hora própria de andarem um pouco sob um luar que testemunha um querer de que você é o único que acha que ainda é preciso disfarçar ou confessar. As mãos se encontram, turvam-se às vistas para tudo o que não seja quem você tem - e que também só vê você e nada além - e como se fosse a coisa mais certa, abraça o corpo que já quer para o seu corpo.
Há um gracejo sobre um batom que se sair não vai ter como retocar, mas nem isso importa mais. Esse momento é aquele em que o mundo em volta fica pequeno pra'quele tanto de contentamento estranho. Sim, estranho. Todo novo. E que parece mais que simplesmente pele – apesar de também ser muito sobre pele. As bocas se querem tão perto quanto a respiração que já acelera igual.
Quando se têm, tudo o que querem é não deixar de se terem e vão deixando a vontade assumir o controle do que virá. Pode ser parado na porta de uma das casas, pode ser chamando pra entrar, mas o que se sabe é que o presente está ali sendo aberto e sendo vivido, fazendo um sentido que anos depois você se lembrará e não terá qualquer dúvida de que agora entende o que houve naquele dia, naquele instante... lá.
E vai sorrir feliz porque seja lá qual foi o rumo da vida, você vai ter sempre esse belo dia da vida para o qual voltar.

quinta-feira, 25 de maio de 2017

É triste ter que ser feliz

É gente demais acreditando que é feliz “de menos” porque fica se comparando com uma série de inverdades pregadas por quem quer dizer que a vida é vivida segundo receitas que garantem que a tristeza é coisa de quem não tem a atitude correta.
Vivemos uma era em que ser feliz é uma exigência. É o que tem que ser, o que deve acontecer, é o que não pode faltar. Se falta, não acontece ou se não é, deve-se abandonar o que há e buscar o novo que satisfaça porque é preciso provar da fé de que a felicidade é a única opção.
É tanta pressão para ser feliz que a gente disfarça. Começa a se mostrar sorrindo, gostando, gozando de uma vida cheia de venturas e de prazeres que não passam da superficialidade de uma existência cuja verdade está escondida dos olhos que não querem ver que nem tudo é como se mostra e se parece ver. E é quando comparamos a verdade da nossa tristeza com a mentira da felicidade (re)produzida que julgamos que somos mais tristes.
A nossa impressão de tristeza pode ter muito a ver com um tempo em que todos devem (pelo menos) se afirmar felizes – e “plenos” (pra usar a expressão da moda).
Não por um acaso, são inúmeras as capas de revistas e chamadas de sites que trazem as receitas sobre a carreira exitosa ou do relacionamento ideal, de como ter o casamento de sucesso, do sexo mais ousado e do orgasmo mais intenso (tântrico!). São tantas as fórmulas que garantem que tudo pode se tornar o máximo, que passamos a buscar culpados quando o que temos é a impressão de vivermos o mínimo.
Passa-se a acreditar que a felicidade é uma questão de exterioridades. Que ela vem de fora para dentro, como se uma experiência ou uma companhia tivessem a responsabilidade de mudar a nossa vida e nos provar que todo dia sempre pode ser o melhor dia. Daí, quando aquela companhia “falha” e nos pegamos entediados, frios ou tristes, pensamos que é nela que há a falta do que nos impede de alcançarmos o destino da felicidade.
Não se pode ter um casamento mais ou menos, um namoro que não seja puro fogo, uma amizade que não confidencie o tempo inteiro ou que chateie com aquela verdade que não é todo mundo que tem coragem de dizer e que são poucos os dispostos a ouvir. Não se pode viver uma vida de menos emoções, adrenalinas e saciedade porque a vida foi feita para ser o ápice de todo desejo realizado. E isso, sim, é triste.
É triste não se sentir com o direito de ser triste e ter que sorrir porque todos fazem que sorriem. É triste se acreditar sendo menos só porque se compara com alguém que não se constrange em afirmar que faz sempre mais do que faz. É triste ter que ser feliz e fazer da felicidade objetivo, ao invés daquele momento que “faz valer a pena ter amanhecido”.
É claro que a felicidade existe e pode ocorrer. Mas assim como ela chega, pode ir e ficar ausente por mais tempo do que a gente gostaria. E até isso faz parte. A vida é feita de momentos que a gente se alegra por terem havido quando gente estava ali gostando de gostar. Momentos que passam, mas que permanecem, não como sentimento, mas como a memória de que é possível sentir.
Alguém disse que permanecer feliz é possível, muita gente acreditou e, agora, quando comparam com sua vida de verdade, vivem sob o peso de um fracasso que nem tem. Por isso que não é preciso lamentar a tristeza e nem se disfarçar de feliz. Basta ser o que é, no instante em que for e aprender que o mal dura o tempo exato que leva para deixar de ser dor. E dor é o que não falta no mundo (não importa quão feliz todos precisem se mostrar).
No mais, a felicidade também há. E, porque há, haverá. E naturalmente. Sem pressa e sem pressão. Sem que tenha que ser, mas mesmo assim simplesmente sendo... feliz.  

quarta-feira, 24 de maio de 2017

Sobre quando se é triste por ter muitos, mas não ter ninguém


É século XXI e as fronteiras caíram e as distâncias parecem cada vez mais irrelevantes. É esse tempo em que posso conversar por vídeo com quem está a milhares de quilômetros de mim e me carregar da sensação de que somos próximos e estamos perto e, apesar disso, me sentir cada vez mais só.
É quando posso manter diferentes conversas simultâneas com as mais variadas pessoas, tratar dos mais variados assuntos, ocupar os mais variados vazios e, mesmo assim, me sentir cada vez mais só.
É quando me torno mais uma dessas pessoas possíveis, dessas que mesmo que sejam mais os que lhes procurem, por mais que sejam muitos e tantos os que lhes perguntam um “Oi. Tudo bem?” e, mesmo despeito de tanta atenção, ainda me sentir relegado a uma solidão que me faz me sentir cada vez mais só.
Posso estar em contato com o mundo, me inserir no contexto de muitos e vários mundos e, neles (e com eles), interagir com a intimidade aparente de quem se conforta com essa aparência... e ainda não entender de onde vem essa impressão cheia da certeza de que sou só.
E daí, talvez, esteja descrevendo um cenário bastante comum do mundo atual. Um mundo em que temos várias possibilidades de nos ligarmos a várias pessoas de uma vez sem que precisemos nos mover, mas que, ainda que haja essas possibilidades muitas, a mesma quantidade é proporcional ao tamanho da falta que faz um contato real, desses que, sem perceber, a gente dispensa e evita há tanto que até sente falta, mas já nem lembra como é.
Porque a vida passa a ser uma vida de inúmeras possibilidades e são essas várias possibilidades que nos impedem de estarmos onde temos para estar. A possibilidade de conversar com várias pessoas a partir de uma tela de telefone (ou de computador), pode acabar tornando desinteressante falar com aquela única de carne e osso, afeto e perfume que tenho na minha direção. Quando começo a me acostumar a fechar janelas de conversas ou simplesmente fazer de conta que não estou “na linha” – ou mesmo bloquear quem me cansa de tanto me procurar – sinto-me com um poder tal que, com isso, talvez não perceba o risco de também passar evitar quem me é relevante e que, certamente, poderia me alegrar (de verdade).
A vida que deveria ser uma realidade alegre se torna uma virtualidade triste e enganosa onde a nossa desatenção nos faz crer que avatares correspondem às verdades que não nos explicam e que o mundo em que não nos veem é atraente justamente porque saberão só o pouco que nos for dado lhes revelar (ou disfarçar, ou distorcer).
A vida vivida na virtualidade dos “encontros sem se encontrar” não passa de uma vida vivida desde detrás de um escudo que cobre quem tem medo de se deixar afetar. Uma vida mais segura porque aprisionados num mundo de faz-de-conta em que podemos ser heróis, mocinhos (por que não vilões?) e nos acharmos relevantes. Uma vida de um faz-de-conta de quem logo pensa ter algum significado aos olhos daqueles que a gente acha que nos sabem, mas que na verdade nem nos olham, nem nos veem. A gente se ilude com essa vida vivida cheia de escudos que nos separam do que poderia significar o fim de uma tristeza que vem de não entendermos por que é que parece que temos tantos ao nosso redor e, ainda assim, na hora que mais precisamos, olhamos em volta e não descobrimos, não vemos e nem temos ninguém.

terça-feira, 23 de maio de 2017

Viver o que é pra ser vivido

Já reparou como a gente dificulta a própria vida? É tanto medo que aprisiona a gente que a gente acaba deixando de fazer tanta coisa que tem vontade e de viver tanta vida que poderia e, daí, passa anos sem entender por que sorri menos do que gostaria ou por que parece não entender o sentido de tantas cores numa vida que se mostra sempre cinza.
A gente acaba tendo medo de ficar triste. Depois, quando menos espera, se pega com medo de ficar alegre (porque vai que daqui a pouco se acostuma com a alegria e precisa conviver com a tristeza) e o resultado disso é um mau costume de se esconder dos sentimentos. E se esconder do que a gente sente é se esconder da gente.
A vida está aí. Está posta. Está dada. Mas a vida é pra quem tem coragem de se permitir viver. Claro que dá pra passar por ela sem essa coragem. É quando você não vai fazer o que quer e vai ignorar os teus desejos. Nesse caso, não se dirá que você viveu a vida. Dir-se-á que, no máximo, você foi vivido por ela. Porque não fez acontecer, mas foi fazendo conforme ia acontecendo. E isso é péssimo.
Não devemos nos esconder do que a vida tem pra oferecer. Não! Viver poder ser divertido, apesar das dores, dos desencontros, dos dias em que nada dá certo, em que aquela pessoa não te liga ou não te atende, que aquela proposta não se realiza ou que aquela ideia que parecia brilhante se mostra terrível. Sempre vem o outro dia, o novo encontro com a mesma ou com uma nova pessoa, a nova ideia, a melhor proposta e daí você nem lembra que um dia ficou triste porque o dia não aconteceu.
A vida é pra viver o que na vida se tem pra viver (dessa vida). A vida é pra quem está querendo a vida. É pra quem não tem problema em se jogar no desconhecido e pra quem não precisa saber se no final vai ter onde encostar. É pra quem curte o caminho e não se ocupa só da chegada. É pra quem entende que todo dia presente não é presente por acaso. A vida não é repetição, mas a novidade pra quem tem a sensibilidade de entender que daqui a pouco tudo muda e, portanto, o efêmero é o que dá gosto e só o que é eterno é que é ilusão. 

segunda-feira, 22 de maio de 2017

Desejo e ação: entre o querer e o precisar

A vida tem dessas coisas. Às vezes a gente pensa demais e faz de menos, às vezes pensa de menos e acaba fazendo demais e, de um jeito ou de outro, acaba se arrependendo de algo. Algumas vezes se arrepende do que fez, outras se arrepende de não ter vivido.
Mas até que ponto vale a pena ter dúvida sobre o que se deve viver?
Certamente haverá quem diga que há aqueles que vivem a vida “fazendo o que é preciso que se faça”. Mas até esses parece que fazem o que é preciso que se faça para alcançar um resultado que tenham previsto ou desejado. Digo isso porque, a mim, parece que sem desejo não pode haver ato, não pode haver ação.
E isso se aplica a tudo na vida. Desde o encontro de um casal até você renunciar algum prazer em nome de uma realizAÇÃO, deve-se sempre partir do entendimento do que se quer. Deve se saber que quer e entender o quanto quer para que, então, faça o que “tem que fazer”.
Talvez isso explique tanta gente se sentindo presa, como se não conseguissem sair do lugar, sentindo-se sem forças para reagir, para fazer o mínimo que parece necessário para realizarem pelo menos o mínimo que lhes é exigido dentro da rotina a que têm aderido e em que se têm sucumbido: muitos vivem o que precisam viver, mas não o que querem viver.
Quando penso no que pode deixar a vida mais pesada, mais enfadonha, menos ou nada prazerosa, sempre me ocorre essa disputa entre “querer e precisar”. É claro que precisamos “batalhar nossa (sobre)vivência”, mas até que ponto é por isso que acabamos estagnados no medo de não conseguir o que queremos e que, então, “nos (des)contentamos” com aquilo que nos ocupa os dias sucessiva e incessantemente?
Vale a pena ficar preso no que não gosta, no que não satisfaz, no que não acrescenta vida – mas tira vida – só porque paga as contas? Será que somos tão incapazes de conseguir algo próximo do que já temos, mas vivendo algo que verdadeiramente queremos, de modo que não precisemos mais lutar contra a falta de vontade de sair da cama, de casa, de sair da gente (porque viver isso é tão ruim que nem mesmo a gente está onde o corpo precisa estar e, por isso, até a alma se recusa permanecer)?
O que precisamos fazer para termos a vida que queremos? Se é para fazer o que é preciso, que seja para algo que vá além desse, simplesmente, “preciso”. Se é para renunciar alguns prazeres, que seja em nome do que, realmente, venha a dar prazer. Prazer de verdade. Prazer duradouro, que satisfaça, que complete, complemente. Que justifique! Se é para sentir a dor da renúncia, que a renúncia tenha razão; se é pra sentir o peso do arrependimento, que ele venha de não ter conseguido o que se tentou quando se quis, mas nunca que ele venha daquilo que não se teve coragem de admitir que queria pelo medo do julgamento que viria de quem te soubesse ou que viria se você não conseguisse.
Não existe motivo pra ficar preso naquilo que não é o que você se quer. Não existe motivo pra ficar patinando sem sair do lugar que não te pertence. Não existe motivo pra ficar com medo de não conseguir o que se deseja. O que não pode é abandonar o sonho que sonha à sorte que não depende de você. A vida foi dada para ser vivida. Então é hora de tratar de viver.