quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Amor, pra que a pressa no amor?

Quase todo mundo que eu conheço elege o início do relacionamento como o melhor momento. Aquela vontade de conhecer, de descobrir, de acertar. O romantismo é a regra e tudo parece se resumir em Vinícius e no seu querer “estar junto se longe e mais junto se perto”. É aquela fase em que se faz questão do beijo, do abraço (e até do aperto de mão). É bom. É o momento do auge da paixão. É arrebatamento, entrega e um sentir sem fim.
Sim, um sentir sem fim. Mas um sem fim que corre o risco inevitável de se findar. Ao longo de todo esse início, os apaixonados tendem a passar por cima dos defeitos do outro. Ignoram-lhes sumariamente. “O véu da paixão encobre os defeitos recíprocos”, para usar a expressão do prof. Cristiano Chaves. E, se nesse tempo as pessoas deixam de considerar certos fatores a respeito do outro, tem-se como um período perigosíssimo para se tomar certas decisões.
A decisão apaixonada perde na severidade de seus critérios. Quando apaixonada a pessoa só enxerga o objeto da sua paixão, que se confunde com o objeto do seu desejo, ambos ganhando um grau de urgência tal que faz com que se queira consumado e consumido no instante de agora (já que se lamenta não tê-lo feito antes). Ora, se é assim, a pressa põe a pessoa sob grave risco de um arrependimento inútil, só porque não curtiu o instante, mas quis antecipar o depois.
A premissa aqui é simples: está apaixonado hoje? Curta a paixão dia após dia, mas sem deixar que ela te guie na tomada de decisões. Deixa que a vida viva naturalmente, sem tantos planos ou expectativas. Não anseie o que virá. Não deixe de fazer/viver hoje porque por alguma razão você considera que é na decisão do que acontecerá amanhã que você poderá, enfim, ser livre pro que quer desde agora. Não se paute no que esperam de você, mas no que você mesma quer para você enquanto pessoa que sente, vivi, deseja. “O amor não tem pressa, ele pode esperar...”, já cantava Chico. Então curta a fase da paixão, deixa que ela vire amor, deixa que o amor faça a rotina e, quando chegar lá na frente, a rotina será parte de você(s).
Agora, se você “radicaliza” e já resolve transformar a paixão em rotina (e por mais que pareça que sim, isso não dá), sinto te dizer, mas a paixão tem prazo de validade. Ninguém vive o tempo todo no limite, o corpo não aguenta, o coração não aguenta. E a paixão está sempre na rotação mais alto do sentimento, do motor da vida. Ah, vocês não gostam da hora do tchau? Vocês mal podem esperar pela hora do OI? O melhor que parece e que poderia ser é que não precisasse haver nem Tchau e nem OI? Bom... mas se é início, curta o início. Só. Experimenta se daqui dois anos, três anos, vocês ainda farão questão um do outro. O teste do tempo é implacável e ser aprovado nele é imprescindível.
No fim, a maior inocência dos apaixonados é acreditarem, de verdade, que toda delícia do agora será a mesma no depois. Acreditarem que não vão mudar e que, se mudar, será para melhor. Acreditarem que só o amor basta. Em suma, acreditarem... talvez por isso, a paixão seja adolescente e o amor seja adulto. Então espera! Pra que a pressa no amor? Ele não tem porque passar. E daí você pode ficar adulto primeiro e decidir depois... 

domingo, 19 de janeiro de 2014

Dividir para somar vida e viver...

Num mundo que parece cada vez mais marcado pela indiferença, a solidão acompanhada parece ser a constante que definirá os anos atuais. Cada vez mais as pessoas estão “interligadas” umas as outras em redes virtuais plenamente capazes de sugerir uma falsa sensação de acolhimento de um grupo que, na verdade, não existe. A partir daí, disfarçam para si mesmas a triste realidade de quem tem dificuldade de entender a sensação de vazio mesmo quando nota a grande lista de “contatos” que conhece em sua vida (de rede) social.
Cada vez mais as pessoas se bastam menos. Quantos e tantos são os que numa noite como outra qualquer – e elas estão cada vez mais parecidas – rolam suas barras de contatos em busca de alguém pra falar o OI e iniciar a conversa que lhes fará, ainda que sozinhas nos seus quartos (ou salas, ou apartamentos), sentir-se acompanhadas. E por isso que acho que as pessoas estão cada vez mais solitárias.
Ora, se convivo apenas comigo mesmo e canso de mim, fico sem a escolha de saber que sou a companhia agradável para o outro que, também cansado de si, remói a solidão desacompanhada dentro de uma vida real vazia do que valha a pena.
Mas como viver sem partilhar a angústia, sem descobrir que a vileza não é só nossa e que as derrotas não nos são exclusivas e nem mesmo o medo ou a covardia?
Se a minha vida é vivida num meio de pessoas perfeitas, que gozam férias perfeitas, que namoram namorados perfeitos, que estão nas festas perfeitas, acompanhado de um grupo de amigos perfeitos, vou achar que o problema está em mim e só em mim. Se eu pauto minha vida na fantasia que me vendem no mundo que não é de verdade (mas virtual), logo lamento a vida que (não) tenho porque ela não se assemelha com aquela vida que os outros (também não) tem.
E o mais curioso é que as pessoas parecem querer mostrar a perfeição da vida que não vivem a fim de serem melhores aceitas por aquelas pessoas que elas julgam viver a vida perfeita que anseiam para si. E no que eu me mostro e não sou e no que o outro se mostra e não é, corremos o risco de nos considerarmos indignos de participarmos um da vida do outro (essa sim de verdade), afastando-nos ainda mais a muita distância que nossas mentiras já nos afastam.
Tanto melhor seria se as pessoas assumissem suas fraquezas mais do que mentissem as fantasias que se creem. Melhor seria que mostrassem sua humanidade cheia de imperfeições, do que sua super-humanidade tão dissociada do que seria possível ser enquanto gente que sente, chora, erra e ri. Se nós nos empenhássemos em viver a vida no corpo, essa vida que sente, que toca, que cheira, que beija, abraça, olha e ouve ao vivo, saberíamos que aquele que parece mais, às vezes está mais e às vezes está menos e que quando ele é mais, me torna mais ainda que eu esteja menos e quando ele estiver menos, será mais do mais que lhe farei. E haveria menos dor, menos angústia, menos “menos”.
Se a mente da gente mente, os olhos, a voz e a postura não. Mas a gente não vive da mente que mente, a gente vive do corpo que sente. Deixa, então, que o outro – que te mereça na reciprocidade de ser merecido por ti (e por mais que você duvide, esses todos são) – saiba o que você sente. Divida-se você e deixa que ele te divida ele. Dividam-se os dois. Dividamo-nos nós uns aos outros e somaremos e ganharemos vida porque, no final da vida, o que vale mesmo é esse viver.

domingo, 5 de janeiro de 2014

Satisfação é costume


Ao contrário do que as redes sociais tentam sugerir quando mostram milhares de sorrisos capturados no lance rápido de uma foto, o que percebo é que as pessoas estão cada vez mais insatisfeitas com sua vida. Talvez esse fato se deva à inevitável comparação que fazem de sua vida real com as vidas ilusórias dos que as cercam e que só mostram o gozo ininterrupto que não têm. Ninguém é feliz o tempo todo e não há quem viva uma vida sem que a dor, o ressentimento e a angústia façam parte. Ainda assim, as pessoas parecem - na sua maioria - viver uma necessidade de se mostraram sempre vitoriosas, infalíveis e inatingíveis pelas agruras da humanidade, de serem humanos. 
A partir daí, comparando a certeza que temos de nós mesmos com a aparência que vemos de quem nos mostra apenas parte do que é, invejamos a fantasia que é culpa exclusiva da nossa imaginação, tendente que é de fazer com que vejamos no outro todos os sucessos que não experimentamos, todas as vitórias que não venceremos e todas as felicidades que jamais ousaremos querer sentir. É quando, então, nossos ombros pesam pra frente, nosso semblante cai, nossos passos ficam carregados e a vida que deveríamos viver passa a ser o que nos vive, consumidos que nos fazemos pelo ocaso de uma existência insatisfatória dentre tantas que parecem tão cheias de satisfação. 
Estamos sendo injustos para conosco e somos apenas nós que temos a condição de revertermos esse quadro tão dolorido.
O primeiro passo para que sejamos justos para conosco é deixarmos de ser nosso principal adversário. Somos nossos próprios adversários quando protagonizamos violências que se voltam exclusivamente contra nós. Quando abro mão de experimentar um prazer que sempre tive sem que uma razão justa - e que seja minha - o justifique, sou violento contra mim e a insatisfação que sinto - por ser causada por mim - se faz motivo para que me goste menos, justamente porque é uma insatisfação a que eu mesmo dei causa. Ora, se me gostando menos, é natural que faça  pouco para alcançar o melhor de mim, afinal, não me mereço. 
É nesse momento que surge a necessidade de que sejamos francos com aquele que vemos todos os dias refletido no espelho diante da gente. É necessário que eu tenha o controle, o domínio de quem sou, do que quero, do que gosto, do que espero e do que posso fazer em razão e como fim de tudo isso. Por tudo isso é que é preciso que paremos de nos renunciarmos a nós mesmos e, antes disso, que sejamos honestos, sem medo dos julgamentos daqueles que, por não serem a gente, não tem qualquer condição de entender quem a gente é e porque a gente gosta disso que a gente gosta.
Como somos imaginativos, logo olhamos nosso próximo e nos permitimos crer que ele não abre mão de si, que goza feliz seu matrimônio, vivendo com um cônjuge que não lhe cobra e nem lhe furta um prazer que é sempre ninfômano, um chefe que sempre lhe compreende mais do que lhe exige, um emprego que lhe satisfaz mais do que fustiga, uma vida sexual que é ativa, plena e desembaraçada de pudores desnecessários, amigos, dinheiro, possibilidades e uma boa sorte que não tivemos e nem cremos que a teremos. Nessa pessoa vemos alguém que se permite, que vive de uma forma mais intensa do que a gente ousa e pensamos que se ele faz - e nem sabemos se realmente é como pensamos - nós também poderíamos, porém, a rotina da vida nos suga e, quando mal nos notamos, somos mera repetição daquilo que sempre fomos e que a maioria também é. 
Uma vida inteira de possibilidades para que sejamos o que quase todos também são. E aí está uma segunda violência para conosco.
Ao longo de nossa vida estamos cercados de pessoas que são mestres em dar palpites. É incrível, mas às vezes a impressão que dá é que praticamente todas as pessoas a nossa volta sabem melhor do que gente o que é melhor pra gente. É por isso que vemos pessoas insatisfeitas nas faculdades, nos empregos, nas cidades em que moram. A maioria dessas sucumbe à pressão e, inseguras em relação ao que sentem, seguem um roteiro escrito por quem não vive sua vida, mas não se toca que se é que sabe de algo, sabe pouco do muito que sente.
Sentir sem medo e respeitar o que sente e o que quer até se permitir buscar o que almeja, é outra forma de acabarmos com a violência para conosco e estarmos satisfeitos com quem seremos se de fato quisermos ser.
Querer ser é ter esperança, mas não a esperança de quem espera. A esperança que se "esperança" é aquela de quem age com o fim de alcançar o que quer, de quem não se furta de arregaçar as mangas para ser o protagonista da própria história e o arquiteto do próprio futuro. É a  esperança que sai do silêncio do anonimato gritando o som da certeza de ser quem é e não o que acha que esperam que seja. E, quando formos - e seremos - o dono de nossa própria história, poderemos nos dar por satisfeitos de verdade, não pela estima que nos prestam (emprestam), mas pela estima que nos temos, porque nos damos. É tudo uma questão de termos o costume de vivermos o que é nosso e o que somos nós e a satisfação nos será costume, costume de satisfação.