sexta-feira, 26 de abril de 2019

Desde quando quis ser professor. Mas não sei se era pra ser assim (Por que quis ser professor?) - uma "autobiografia"


Me peguei fazendo uma retrospectiva de mim mesmo.
Logo no 2º ano de faculdade entendi que gostaria de ser professor e, para minha sorte, apesar de todos os traumas e senões que tenho em relação às escolhas passadas, a forma como vivi minha graduação me permitiu fosse envolto de pessoas que o tempo me provara essenciais.
Muito embora não pretenda dizer, aqui, quem achei melhor que outros – mesmo porque se já não era justo na época seria ainda menos justo hoje – já naquele 2º ano eu tinha referência de professores cujo modelo me acompanha até hoje. Claro que não me furtaria o prazer de citar (porém por pudor não os marcarei nenhum) nomes como do Davys, do Marlon, David, Elias e Geraldo porque compõem o grupo dos professores nessa fase até o 2º ano.
Além deles, destacaria especial e carinhosamente, Priscilla (ela já no 3º ano) e que, em sempre ansiosos, esperançosos e hoje saudosos diálogos, me sugeria uma visão de mundo menos estreita que a que eu tinha – ela com uma visão mais ampla do que jamais terei – e também uma esperança de atuar em prol de um mundo melhor que até hoje que lhe assisto de longe, ainda me comove.
Daí que, de alguma forma, olho pra trás os últimos dezessete anos e preciso ser mais feliz que triste, mesmo se lamento as leituras que poderia ter feito, mas não me foram exigidas num tempo em que eu mesmo não sabia me obrigar; ou mesmo se lamento todas as outras possibilidades que talvez não vivesse, mas que me são fantasmas que assombram e retornam e acusam sem parar. Mas foi essa época determinante em que conheci pessoas – e daí não só professores – que me fizeram quem sou; amei as primeiras mulheres com a urgência de uma poesia improvisada no auge do estupor (todas elas devidamente referidas e reverenciadas nO Trovante), desgarrei-me de morais que me foram dadas, mas não eram minhas, fiz-me no despertar da consciência de que ainda haveria muito a ser feito.
Pois sim. Acho que a melhor parte de mim vem diretamente desse fato de ter sido acolhido – adotado mesmo – por esse grupo de pessoas (não muito) mais velhas que eu e que, ao me receberem, também me abriram portas para um mundo (nem sempre cru, apesar de potencialmente cruel) de que graças a Deus não me livraria mais.
E claro que não ficaram apenas esses. Antes já teria havido Tony com seminários de português que me ajudaram na timidez de me apresentar em um púlpito que não era de igreja. Já no 4º ano ainda pude me encantar com as aulas da Fabíola (que privilégio), ou mesmo com a expertise (e parceria) do Malwe, a parcimônia e educação do Paulo Cachimbo (na verdade, ele, no 3º ano, caminhando lentamente em uma das raras noites que cheguei cedo pra me dizer: “o senhor não se resfrie porque já estourou em faltas”). Ainda tive muito boas aulas com meu pai (àquela época se descobrindo professor) e em tudo isso, muito embora matando muita aula (as do meu pai, não), fui me querendo também professor.
Mas mesmo carregando a dor de não ser bem querido por todos – aquela cruel ilusão narcisista – , mas querendo a inocência de ao menos sê-lo pela maioria, sempre me quis um professor próximo dos alunos tanto quanto fui desses professores que hoje confesso, em texto, que me foram essenciais para que eu fosse quem sou na essência tantas vezes desconhecida.
E acho que por algum tempo o fui. Mas desde algum tempo talvez tenha deixado de saber como se faz para ser (para continuar sendo). E isso me exaspera na mesma medida em que me entristece.
Eu, particularmente (óbvio que é particularmente se falo de mim, mas enfim), nunca gostei de nada muito rigoroso ou formal, tal pecha me incomoda porque sinto que ela também afasta. Me incomoda o excesso de siso na vida. E tudo piora quando me parece que em algum momento é como se alguém lograra o êxito de estabelecer um muro feito de detrações e maledicências recíprocas entre professores e alunos, como se compusessem classes antagônicos e não complementares que o são.
E por que me entristece? Principalmente porque não me fiz, nem nunca me quis professor para que um aluno me visse como adversário do seu crescimento, ou temesse o que eu pudesse pensar: seja do que pensa de mim (por mais que invencionices e mentiras magoem), seja se pensa contra mim ou diferente do que penso. Para mim, sempre será mais importante que ele seja quem é e pense conforme seja. Quero ser parte e não fim.
Na verdade, sempre acreditei que, entre professores e alunos, um pudesse ser a extensão do outro já que os afetos nos fazem sempre outro. E foi esse que me quis: o que diz, mas que saiba ouvir; o que fala o que é necessário, mas não cala o que é preciso falar porque também é preciso ouvir.
E me preocupa ainda mais porque vejo que, de alguma maneira, se não houver cuidado, o professor se isola na personagem que traveste, põe-se acima do aluno e, bastando-se em quem é e no que crê, deixa de querer saber o que aquele aluno anseia, o que ele consome na sua rotina, na sua cultura, na sua forma de ser. Logo, não é de se espantar que haja um estranhamento triste que, por sua vez, gerará um professor distante e, portanto, entristecedor porque inapto no mister de inspirar ou motivar seus alunos tanto na hora da dúvida quanto na hora da dor.
E até isso pode piorar: lembro de certa vez, e isso já contam uma pluralidade de anos, ter ouvido a recomendação de que o professor deveria passar ao largo de qualquer problema pessoal do aluno porque amanhã poderia ser acusado por mal aconselhamento. E são coisas como essas que me indignam: por que ver alguém ansioso pelo que talvez se justifique numa falta de vivência que alguns anos a mais ajustariam, e não se importar? Ser professor tem a ver com vida e aprender a viver (não só ensinar).
De todo modo, é triste assistir que há uma cada vez maior ansiedade pelo fim de uma fase que deveria ser bem vivida a ponto de dar saudade antes de terminar. E que essa ansiedade não é pela expectativa de colher os louros do sucesso que lhes virá, mas sim, fruto do mais puro estado de esgotamento emocional. É sinal de que algo deu muito errado. Mas onde está o “mea culpa” de quem também tem culpa? Ou se viverá de intransigência em intransigência, ao argumento de que deve se ser duro porque a vida também é?
Quanto a mim que escrevo como se testificasse a vida finda, mas que espero longa, tenho que gostaria de ser lembrado por quem reconheça, em mim, q fui o melhor que minha parca capacidade me permitiu que eu fosse. Mas gostaria de ser ainda mais lembrado como quem não foi ruim, nem se quis difícil ou dificultoso, antes, procurou deixar claro que, mais do que da matéria ensinada (ou só lecionada), gostava de quem teve, por todo esse tempo, diante de si.
Isso, sim, seria minha boa fortuna.

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