segunda-feira, 28 de setembro de 2009

RECEITA DE BOLO


VIVENDO A INOCÊNCIA DO AMOR

A final de contas, viver se baseia em que?

Qual a razão desse quotidiano em que somos coadjuvantes e protagonistas em diversas sortes diferentes?
Seria a simples jornada vivida entre o “de onde viemos” e o “para onde vamos”?
Certo é que nascemos todos, todos amamos, depois de amarmos casamos e, dois dias depois, o amor encerrado, estamos prontos para a fase em que todos morremos.
Mas entre o infortúnio do casamento e o momento em que morremos ainda há muito do que ainda não vivemos.
O que será que falta se viver dentre o que se pode fazer desde que a um relacionamento a dois nos submetemos?
A despeito de todas e tantas vezes em que ouvimos os casados praguejarem sua sorte, p’ra cada dois descontentes há dez “contentes” querendo se “descontentizar “.
Quando sozinhos sentimos a obrigação de sermos gregários e querermos alguém que nos seja a companhia nas noites fria, o aconchego no momento de carência, a força na hora da fraqueza. Quando enfim temos quem queremos, como bem ensina a lei dos desejos, já não queremos mais não “quem”, mas “o que” outrora queríamos nós.
A solidão parece a melhor das pedidas para quem parece que nunca se vê sozinho ainda que em um dia de 24 horas esteja junto (e acordado!) em no máximo 04 dessas horas. E ainda assim, qualquer comentário, qualquer troca de olhar, qualquer dos quaisquer, torna-se insuportável aos olhos de quem sucumbido pela rotina.
Rotina... inimiga mais poderosa dos casais; assassina implacável de amores; conseqüência inevitável da vida em comum.
Surgida a rotina, aqueles que bem se querem passam a buscar em si as armas para que lutem contra ela em favor do amor que juram sentir. Como resultado soluções mais simples como a realização de novos programas, a busca do interesse aparentemente perdido, jantares, juras de amor, lembranças sutis ao longo do dia representadas por ligações românticas em busca daqueles momentos de início até as mais drásticas, de caráter sexual, em busca de fantasias e outras formas de apimentar a já tão combalida vida a dois. Querem, esforçam-se e até conseguem, mas o que é paliativo se faz finito na árdua luta contra o tempo.
Mas o que sobra então? Seria a decretação prematura (se prematura!) do fim a solução mais aconselhável em face dessa batalha que se mostra invencível?
Não seria! Mas antes, por que de não se admitir os ciclos da vida como inevitáveis que se mostram e aceitá-los como a conseqüência irremediável do convívio comum?
Por que temer a rotina que surge e que faz ver que o carinho é muito mais do que sexo e que o amor se mostra naquela necessidade de se estar junto, de reconhecer a necessidade daquela companhia como sendo a mais importante e por isso diária, mas sem que isso tenha que necessariamente deixar de significar os espaços de vida em que só entrará a individualidade daquele um que forma o dois?
Quando na vida se diz que ninguém é de ninguém é porque de fato não é mesmo. Nos emprestamos para fazer bem a quem sabemos nos faz bem também. E só.
Por tendência da nossa própria natureza é que impomos regras, prescrevemos sanções a esse relacionamento e damos caráter cerimonioso a tudo quanto diga respeito aos nossos atos.
Nos queixamos da atenção não recebida ou da voz mais alterada, sem que queiramos entender que tudo faz parte da necessidade nossa de nos sentirmos independentes de quem quer que seja.
E pior, egoisticamente, passamos a desejar sejamos nós únicos na vida dos que cremos nossos. Não romântica ou sexualmente, mas sim, em tudo. Não conseguimos imaginar que se conceba um programa em que não estejamos incluídos ou que vislumbre um futuro onde não estejamos nós... tolhemos os que gostamos até mesmo do seu direito de sonhar se neste sonho não estivermos nós. Mas com que direito?
Talvez se justifique o querer ser a razão única da vida, o objeto único do desejo, o destino certo do bem querer, mas que só se queira e não faça disso um objetivo, porque aí estaremos mais uma vez desrespeitando o ciclo da vida que, por tudo quanto já mostrou na sua história, torna-nos sujeitos às mais diferentes situações, algumas das quais à que se quer escolhemos nos impor.
Mas como se dizer que a vida a dois já não se faz mais objetivo de homens e mulheres dentro das suas mais diferentes razões? Oxalá fosse ela movida pela certeza de que independentemente do momento em que a palavra é dita ou que o gesto é interrompido, há ali muito mais do que o desejo físico e muito além do que o medo de se estar só. Há ali a certeza de se ter encontrado a alma que completará a metade ansiada de nossa alma; a vida que será companhia nos dias da nossa vida, mas com a necessária complacência e sabedoria de seus limites; o amor que mais que carnal, é divino; e que como divino, também fraterno para que eterno e do qual se saberá sempre o mais importante, mesmo naqueles momentos em que, na verdade, nem seria tão importante assim.

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