sábado, 31 de outubro de 2009

Quando não nos reconhecemos em nós




É aquela clássica cena que já vimos em muitos filmes. O sujeito acorda, levanta-se da cama; olhos fechados pela preguiça matinal. Já no banheiro passa a água no rosto. Ainda curvado alcança a toalha próxima da pia e começa a enxugar seu rosto a medida que vai se endireitando e a câmera passa a focar seu reflexo no espelho. Resultado? Quando se olha no espelho, não é mais ele quem lhe surge, mas outro rosto qualquer. Gritos, desespero, maldições e mais gritos... quem é aquele que ele vê no espelho? Se é ele quem vê, não deveria ver-se a si e não a outro?

Certamente já vimos essa cena mais de uma vez. Soa sempre o absurdo. O cinema feito pastelão elevado à máxima potência. Quais as chances de se olhar no espelho e não se ver a si mesmo, mas antes, onde deveria estar você encontrar outro? Eu diria que são muitas!

Inevitavelmente, nos últimos tempos tenho pensado muito nisso e já há muito venho tentando escrever sobre o tema e a medida que faço essas introduções, confesso que não sei como o texto acabará, mas me pergunto: quando nos olhamos, será que nos reconhecemos?

Voltemos anos passados. Lembremo-nos dos sonhos sonhados e dos desejos mais íntimos; do futuro que nos planejamos e que muitas vezes à cumplicidade da lua e das estrelas assistimos como se fossem a certeza dos próximos capítulos que nos chegariam.

Todos nós em algum momento – de inocência ou não – nos imaginamos em algum lugar, fazendo alguma “coisa” e tendo sucesso. Nisso, representamos o nosso ideal de futuro. A nossa vida como ela deveria ser.

Só que a vida é uma sucessão de escolhas. Não é segredo que o que chegamos a ser é o resultado de nossas escolhas que, por sua vez, são moldadas pelas circunstâncias a que nos temos que nos sujeitar.

Mas não consigo me conformar que a conseqüência natural da existência esteja em não ser quem se quis ser. Não consigo imaginar que uma vida que se mostra a prova mais irrefutável da seleção natural (em que os fortes se sobrepujam aos fracos), admita que haja um conformismo em relação ao que não se foi; um contentamento idiota com o que se está sendo quando o que se é, é tudo aquilo que não se pensou, e pra pior.

Porque se for, os sonhos deveriam ser evitados. Não se deveria almejar um futuro que certamente não terá.

Mas é estranho! É estranho quando vejo que muito do que imaginei que seria me era possível, mas que nessa estrada fiz escolhas que me distanciaram daquilo que ao menos pensei que eu era, escolhas que me acompanharão pelo resto dos dias em que eu for o que venha a ser, pois o momento, agora, já é precluso.

E ainda que reencontre um caminho que me parece cada vez mais distante, não haverá quem me devolva o momento que ficou no longe e os dias em que fui esse que, ao se olhar no espelho, não se enxerga a si, mas só a triste conseqüência do que, pobremente, chegou a ser.

2 comentários:

Unknown disse...

Como sempre diz seu avô, o sábio Luiz Gama, a gente veio ao mundo pra fazer o que não queremos e, nas raras oportunidades em que fazemos o que desejamos nos sentimos felizes, o que - agora digo eu - comprova a idéia de que felicidade não existe, apenas momentos felizes...paradoxalmente, entendo que a felicidade existe sim e só será feliz quem se convencer de que viver momentos felizes e saber valorizá-los é o suficiente...pra arrematar, sejamos normais, isto é, sejamos o que somos e não o que as pessoas querem que sejamos...simples assim...

Vanda disse...
Este comentário foi removido pelo autor.